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"NO QUE DIZ RESPEITO A COLUNAS DE JORNAIS, “Ask Marilyn”, da revista Parade, tem que ser considerada um grande sucesso. Distribuída em 350 periódicos que apresentam a invejável circulação combinada de quase 36 milhões de exemplares, essa seção de perguntas e respostas foi lançada em 1986 e continua firme. As perguntas podem ser tão esclarecedoras quanto as respostas, uma espécie de pesquisa (não científica) do Instituto Gallup do que se passa nas mentes da população americana. Por exemplo:
 

Quando a bolsa de valores fecha ao final do dia, por que todos continuam por lá, sorrindo e batendo palmas, independentemente de as ações terem subido ou descido? Uma amiga está grávida de gêmeos, que sabe serem fraternos. Qual é a chance de que ao menos um dos bebês seja menina?
 

Quando passamos de carro perto de um gambá morto na estrada, por que leva cerca de 10 segundos até sentirmos o cheiro? Presumindo que não passemos exatamente por cima do gambá.
 

Aparentemente, a população americana é formada por pessoas muito ligadas às questões práticas. O que devemos notar aqui é que cada uma das perguntas tem um certo componente científico ou matemático, característica apresentada por muitas das perguntas respondidas na coluna.
 

Poderíamos nos perguntar, especialmente se soubermos pouco sobre matemática e ciências: quem é essa guru chamada Marilyn? Pois bem, é Marilyn vos Savant, famosa por ser citada há muitos anos no Hall da Fama do Livro Guinness dos recordes como a pessoa com o maior QI já registrado no planeta (228). Ela também é famosa por ter se casado com Robert Jarvik, inventor do coração artificial Jarvik. Porém, às vezes as pessoas famosas, apesar de suas outras realizações, são lembradas por algo que, se dependesse delas, desejariam que nunca tivesse acontecido – “Eu não tive relações sexuais com essa mulher.” – Esse talvez seja o caso de Marilyn, famosa pela resposta à seguinte pergunta, surgida em sua coluna num domingo de setembro de 1990 (alterei ligeiramente as palavras utilizadas):
 

Suponha que os participantes de um programa de auditório recebam a opção de escolher uma dentre três portas: atrás de uma delas há um carro; atrás das outras, há cabras. Depois que um dos participantes escolhe uma porta, o apresentador, que sabe o que há atrás de cada porta, abre uma das portas não escolhidas, revelando uma cabra. Ele diz então ao participante: “Você gostaria de mudar sua escolha para a outra porta fechada?” Para o participante, é vantajoso trocar sua escolha?
 

A pergunta foi inspirada nas regras do programa de televisão Let’s Make a Deal, transmitido de 1963 a 1976 e relançado diversas vezes entre 1980 e 1991. O principal atrativo do programa era o belo e simpático apresentador, Monty Hall, e sua assistente de roupas provocativas, Carol Merril, Miss Azusa (Califórnia) de 1957.
 

Para surpresa dos idealizadores, mesmo após a transmissão de 4.500 episódios ao longo de 27 anos, essa questão sobre probabilidade matemática acabou sendo seu principal legado. A pergunta imortalizou tanto Marilyn como o programa em virtude da veemência com que os leitores de Marilyn vos Savant reagiram à coluna. Afinal de contas, parece ser uma pergunta bastante tola. Há duas portas possíveis – se abrirmos uma, ganhamos; se abrirmos a outra, perdemos –, portanto parece evidente que, quer mudemos a escolha, quer não, nossa chance de ganhar é de 50%. O que poderia ser mais simples? A questão é que Marilyn afirmou em sua coluna que é vantajoso mudar a escolha.
 

Apesar da conhecida letargia popular no que diz respeito aos temas matemáticos, os leitores de Marilyn reagiram como se ela tivesse defendido a devolução da Califórnia ao México. Por negar o óbvio, Marilyn recebeu uma avalanche de correspondência, 10 mil cartas, pelo que estimou. Se perguntarmos à população dos Estados Unidos se concorda com as ideias de que as plantas criam o oxigênio que existe no ar, de que a luz viaja mais rápido que o som ou de que leite radioativo não se torna seguro para o consumo depois de fervido, receberemos respostas negativas na casa das dezenas (13, 24 e 35%, respectivamente). Porém, nessa questão, os americanos estavam unidos: 92% achavam que Marilyn estava errada.
 

Muitos leitores pareceram desapontados. Como era possível que uma pessoa em quem  confiaram numa gama tão ampla de assuntos se confundisse com uma pergunta tão simples? Seu equívoco seria um símbolo da deplorável ignorância do povo americano? Quase mil PhDs escreveram cartas; muitos deles eram professores de matemática e pareciam especialmente irados. “Você errou feio”, escreveu um matemático da Universidade George Mason:
 

Deixe-me explicar: se mostrarmos que uma das portas não contém o prêmio, essa informação altera a probabilidade das duas escolhas remanescentes para 1/2 – e nenhuma das duas apresenta motivos para ter probabilidade maior que a outra. Como matemático profissional, estou muito preocupado com a falta de conhecimentos matemáticos do público em geral. Por favor, ajude a melhorar essa situação confessando o seu erro e sendo mais cuidadosa no futuro.
 

Da Universidade Estadual de Dickinson veio o seguinte: “Estou chocado ao ver que, depois de ser corrigida por ao menos três matemáticos, a senhora ainda não tenha percebido o erro.” De Georgetown: “Quantos matemáticos enfurecidos são necessários para que a senhora mude de ideia?” E alguém do Instituto de Pesquisa do Exército dos Estados Unidos afirmou: “Se todos esses PhDs estiverem errados, o país está passando por graves problemas.” As cartas continuaram a chegar, em números tão elevados e por tanto tempo, que, depois de dedicar algum espaço à questão na coluna, Marilyn decidiu que não mais tocaria no assunto. O PhD do Exército que escreveu talvez estivesse certo ao afirmar que se todos aqueles PhDs estivessem errados, seria um mau sinal. Mas o fato é que Marilyn estava certa. Ao ser informado disso, Paul Erdös, um dos maiores matemáticos do século XX, afirmou: “Impossível.” A seguir, quando apresentado a uma prova matemática formal da resposta correta, ainda assim não acreditou nela, e ficou irritado. Somente depois que um colega preparou uma simulação computadorizada na qual Erdös assistiu a centenas de testes que geraram um resultado de 2 para 1 a favor da mudança na escolha da porta, ele admitiu estar errado.
 

Como é possível que algo aparentemente tão óbvio esteja errado? Nas palavras de um professor de Harvard especializado em probabilidade e estatística: “Nosso cérebro não foi muito bem projetado para resolver problemas de probabilidade.” O grande físico americano Richard Feynman me disse uma vez que eu jamais deveria pensar que compreendi um trabalho de física se tudo o que fiz foi ler a prova de outra pessoa. A única maneira de realmente entender uma teoria, afirmou, é refazer a prova por conta própria – quem sabe você não acaba refutando a teoria? Para nós, que não somos Feynman, ficar provando novamente os trabalhos de outras pessoas pode ser uma boa maneira de perder o emprego e acabar aplicando nossas habilidades matemáticas como caixa de supermercado. Mas o problema de Monty Hall é um dos que podem ser resolvidos sem nenhum conhecimento matemático especializado. Não precisamos de cálculo, geometria, álgebra, nem mesmo anfetaminas, que, pelo que se diz, Erdös gostava de tomar (reza a lenda que, certa vez, depois de parar de tomá-las por um mês, ele disse: “Antes, quando eu olhava para uma folha em branco, minha mente estava cheia de ideias. Agora, tudo o que vejo é uma folha em branco.”)  Tudo o que precisamos é de uma compreensão básica sobre o funcionamento das probabilidades e da Lei do Espaço Amostral.

 

 

 
 
"Pensar fora da caixa" isto é o que esta faltando aqui no fórum.
Edited by Fernandes20
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Posted
20 minutos atrás, Joselmo Salvatore disse:

O Andar do Bêbado - Como o acaso determina nossas vidas - Leonard Mlodinow ;-)

 

Exatamente, esqueci de citar a fonte.

 

Estava lendo-o a pouco tempo.

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