Nos longínquos anos 60, eu e meu amigo combinamos de ir nadar lá no bico da pedra. Muitas crianças iam lá nadar, passávamos alegres tardes nesse recanto.
Sempre na volta meu amigo estava com fome e passávamos em casa comer o que tivesse. De comida ele entendia.
Tem batatinha?
Procurei e achei umas batatinhas e ele me disse: - Vamos comer as cascas.
Lavamos e descascamos as batatas, bem fininho dizia. Óleo na panela, bem quente, colocávamos as cascas e fritava bem. Servia em um prato, jogávamos sal e comíamos gostoso como as crianças comem. Não imaginava que podíamos comer a casca da batatinha, foi novidade para mim.
Um dia não tinha batatinha, e com pão amanhecido ele me ensinou outra receita. Rabanada salgada. Comemos tanto que passei mal. Muito óleo, muito ovo, muitos pedaços comidos.
O prazer em comer em grande quantidade era um de seus atributos mais reconhecido pelos seus amigos, o que rendeu boas histórias que hoje conto para vocês.
Um dia ele me disse:- Vamos comer fósforo?
Intrigado, respondi:- Comer fósforo?
-Sim, fósforo. Ouvi minha mãe dizendo que fósforo é bom para a memória.
Nunca ouvi isso antes, como também não havia ouvido sobre comer cascas de batatinha ou a rabanada salgada entre outras coisas que ele me havia apresentado.
Achei estranho e não comi, mas meu amigo devorou cinco caixinhas de palitos de fósforos da marca "Fiat Lux". Retirava a pólvora dos palitos, colocava no meio do pão como recheio e comia gostoso e dizia entre uma frase e outra que aquilo realmente era bom para a memória.
Outro caso curioso, foi quando uma família vizinha o convidou para um churrasco. Meu amigo comeu tanto, tanto, que quando a vizinha o entregou para sua mãe pediu para ela observar ele durante a noite, pois estava preocupada com a quantidade de comida ingerida pelo meu amigo.
Lá pelas tantas da madrugada, eis que ele começou a gemer e sua mãe, já preocupada com o alerta da vizinha, se postou ao lado de sua cama e disse:
- O que foi filho, está passando mal?
Não, mãe. Estou com fome.